Oxitocina tem resultados promissores em crianças autistas

POR CESAR BAIMA. O Globo. 11/07/17


Experimento mostrou benefícios na interação social, em especial nas que tinham baixos níveis do hormônio no organismo
Crianças que tinham uma nível baixo de oxitocina no organismo antes do tratamento foram as que mais melhoraram em teste padrão de interação social - shutterstock.com/PhotoUG
RIO - A oxitocina pode ajudar a melhorar a interação social de crianças com transtornos do espectro autista (TEA), especialmente as que têm um baixo nível prévio da substância, apelidada de “hormônio do amor”, no organismo. A conclusão é de estudo que pela primeira vez analisou a influência da concentração de oxitocina no sangue das crianças antes do tratamento na resposta ao mesmo, já que experimentos anteriores com a administração do hormônio em pacientes autistas tiveram resultados contraditórios.


- Nossos resultados sugerem que algumas crianças com autismo vão se beneficiar do tratamento com oxitocina mais do que outras, e que os níveis de oxitocina no sangue podem ser um sinal biológico que nos permita prever se uma criança vai responder de forma máxima ou não – resume Karen Parker, professora da Universidade Stanford, EUA, e primeira autora de artigo que relata o estudo, publicado nesta segunda-feira no periódico científico “Proceedings of the National Academy of Sciences” (PNAS).

No novo experimento, os cientistas avaliaram 32 crianças de seis a 12 anos diagnosticadas com TEA divididas aleatoriamente em dois grupos. O primeiro, formado por 13 meninos e uma menina, recebeu duas doses diárias de oxitocina por meio intranasal durante quatro semanas, enquanto o segundo, com 14 meninos e 4 meninas, serviu de controle, recebendo apenas um placebo.

Ao fim do tratamento, todas foram avaliadas seguindo um questionário padrão para interação social preenchido pelos próprios pais, a Escala de Resposta Social (SRS, na sigla em inglês). Segundo os pesquisadores, embora numa análise inicial, sem considerar os exames de sangue, os resultados tenham sido inconclusivos como em outros estudos, quando levados em conta os níveis prévios de oxitocina no organismo, as crianças que tinham concentrações baixas mostraram uma melhoria significativa no reconhecimento de emoções medido pelo SRS. E a melhora foi observada em ambos grupos, pois mesmo as crianças que não receberam o hormônio exibiram uma alta em seus níveis no organismo numa espécie de “efeito placebo”, que os pesquisadores creditam a um maior contato social em razão da própria participação no experimento e destacam como mais um indicador da importância da produção endógena (interna) da oxitocina na terapia e seus resultados.

Ainda assim, tanto os cientistas responsáveis pelo estudo quanto especialistas ouvidos pelo GLOBO ressaltam que ainda é cedo para considerar a oxitocina com um tratamento eficaz do autismo.

- Toda vez que se fala em um tratamento para um transtorno que não tem cura, crônico e que afeta o desenvolvimento como o autismo deve-se ter muito cuidado – lembra Clay Brites, neuropediatra do Instituto Neurosaber e pesquisador do Laboratório e Estudos de Dificuldades de Aprendizagem da Unicamp. - Os resultados são muito promissores, mas ainda estamos longe de dizer que temos uma medicação definitiva para TEA, já que a oxitocina se mostra eficaz apenas no reconhecimento de emoções e não tem efeito em outros sintomas do autismo, como comportamentos repetitivos e dificuldades na linguagem, além de poder aumentar a irritabilidade, piorando a situação de pacientes que já são muito agitados ou levando os que não são a desenvolver hiperatividade. Ainda não é um milagre nem a promessa de um milagre.

Opinião parecida tem Francisco Assumpção, coordenador do departamento de Psiquiatria da Infância e Adolescência da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP).

- Cada vez que aparece este tipo de estudo temos o problema de as pessoas acharem que se descobriu a cura, um grande milagre para um quadro sério que é o autismo – diz. - Mas estes resultados ainda são iniciais e ainda não existem dados suficientes para justificar o uso clínico da oxitocina no tratamento do autismo. Antes de começar a receitar, vamos precisar de mais estudos, com amostras e controles maiores para responder várias questões em aberto, como se estas melhorias persistem. 

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